Saboreando a Palavra – Dia 15/09/2019
A plena misericórdia divina – Lc 15,1-32 – Neste 24º Domingo do TC, Jesus continua seu “caminho para Jerusalém”. Mais uma “pausa literária” de Lucas para inserir uma das mais belas páginas da Sagrada Escritura. Jesus prossegue seu caminho para a Jerusalém, lugar da revelação da plena misericórdia divina, e nesta “pausa literária” do evangelista, temos três parábolas cujo objetivo é revelar a misericórdia de Deus. Com efeito, todo o capítulo 15 de Lucas contém os relatos das chamadas “parábolas da misericórdia”. Trata-se de um tema caro a Lucas. Para Lucas, Jesus é o Deus que veio ao encontro da humanidade para lhe oferecer, em gestos concretos, a salvação, a plenitude da misericórdia. As parábolas da misericórdia expressam, de forma privilegiada, o modo de ser de Deus, a plena misericórdia para com os considerados perdidos ou extraviados. O discurso de Jesus apresentado em Lc 15 tem seu cenário numa situação muito concreta. Ao ver que alguns cobradores de impostos e pecadores se aproximavam de Jesus e eram acolhidos por Ele, os fariseus e os escribas, expressaram o seu desconforto e sua arrogância. Por tradição e convicções religiosas, não admitiam qualquer contato com os pecadores e desclassificados. Chegavam ao extremo de se desviarem do caminho para não se cruzar com eles. E Jesus “senta-se à mesa com eles”. Algo impensável para estes “donos da salvação”. É essa realidade que vai provocar o discurso de Jesus sobre a atitude misericordiosa de Deus. Sem considerar os versículos iniciais (vv 1-3), as parábolas ficam belas narrativas, por vezes consideradas fatos reais históricos, particularmente a do “filho perdido”. Por meio destas comparações, Jesus proclama o jeito de ser de Deus, a plena misericórdia divina. As três parábolas do capítulo ficam soltas e perdem seu verdadeiro sentido se não se tomar em consideração a atitude dos fariseus e doutores da Lei. Estes versículos iniciais formam como que um gancho ou prego na parede, no qual se “penduram” os três quadros. A parábola da ovelha perdida é comum a Lucas e Mateus (cf. Mt 18,12-14), embora em Mateus esteja em outro contexto. As da dracma perdida e do filho pródigo são exclusivas de Lucas. As três parábolas da misericórdia pretendem, portanto, revelar o projeto do Reino que tem seu centro, seu coração, na misericórdia de Deus. Elas definem a “lógica de Deus” em relação aos “perdidos”. A primeira parábola é a da ”ovelha perdida” (vv. 4-7). Trata-se de uma parábola sem muita lógica, pois qualquer cuidador de ovelhas sabe que não se abandona noventa e nove por causa de uma. Também não faz sentido todo o exagero da festa diante de um fato tão simples em si. Este recurso literário mostra o jeito de ser de Deus: pura alegria, gratuidade, misericórdia. O pastor das cem ovelhas não recrimina a perdida, mas carrega-a carinhosamente sobre os ombros. A segunda parábola (vv. 8-10) reafirma o ensinamento da primeira. O amor misericordioso e constante de Deus busca aquele que se perdeu e alegra-se quando o encontra; uma alegria partilhada com “amigas e vizinhas”. A alegria da misericórdia divina é difusiva e compartilhada. A terceira parábola (vv.11-32) apresenta um pai, em cujo coração só habita o amor pelo filho, aconteça o que acontecer. Ele ama o filho rebelde e ingrato, apesar da sua rudeza em pedir a herança antes da morte do pai, de seu comportamento cruel. Esse amor transbordante do pai se revela na forma emocionada com que recebe o filho. Nada de cobrança, de repreensão, de castigo. Só alegria, uma alegria que até impede o filho a confessar seus erros tão longamente ensaiados. Esta parábola é a descrição mais bem elaborada sobre o modo de ser de Deus. Um modo de ser que não cabe na lógica humana tão perpassada pelo ódio, pelo desejo de vingança, pela intolerância. É esse modo de ser que Jesus propõe aos fariseus e escribas que, na parábola, encarnam a atitude do “filho mais velho”, movidos por autossuficiência, intolerância e exclusão. Onde falta a gratuidade, a misericórdia não encontra espaço. Ir. Zenilda Luzia Petry. FSJ