IV Domingo do Tempo Comum
A lógica do Reino e a lógica do mundo – Mt 5,1-12 – As leituras deste 4º domingo nos surpreendem com a uma reflexão sobre o “Reino” e a sua lógica. Duas lógicas perpassam toda a nossa história: a do mundo e a de Deus. A lógica do mundo tem seu caminho bem definido: visa o poder, a riqueza, a satisfação e a projeção pessoal e individual. A lógica de Deus gira em sentido contrário: são os pobres, os humildes, os que aceitaram despir-se do egoísmo, do orgulho, dos próprios interesses que são verdadeiramente felizes. No Evangelho de Mateus temos como que a “carta magna” do Reino de Deus. Jesus proclama “bem-aventurados” os pobres, os mansos, os que choram, os que procuram cumprir fielmente a vontade de Deus, porque já vivem na lógica do “Reino”. Além destas proclamações, recomenda-nos a misericórdia, a sinceridade de coração, a luta pela paz, a perseverança diante das perseguições. Uma lógica invertida diante da lógica do mundo. Para o Evangelho, o contrário é o lado certo.
Olhando o Evangelho de Mateus mais de perto, temos que, depois de dizer quem é Jesus (Mt 1,1-2,23) e de definir a sua missão (cf. Mt 3,1-4,16), o evangelista, com palavras e com gestos, mostra qual é a missão de Jesus. Do ponto de vista literário, temos o grande “Sermão da Montanha” (Cf Mt 5-7), que inicia com as “bem-aventuranças”. O cenário do relato é no cimo de um monte. A indicação geográfica não é inocente: transporta-nos à montanha da Lei (Sinai), onde Deus Se revelou e deu ao seu Povo a antiga Lei. Agora é Jesus que, numa montanha, oferece ao novo Povo de Deus a nova Lei que deve guiar todos os que estão interessados em aderir ao “Reino”.
As “bem-aventuranças” devem ser entendidas no contexto da pregação sobre o “Reino de Deus”. Jesus proclama “bem-aventurados” aqueles que o mundo despreza, os que estão numa situação de fraqueza, de pobreza, de abandono, pois no “Reino” a situação destes “pobres” vai mudar radicalmente.
As quatro primeiras “bem-aventuranças” (vv. 3-6) estão relacionadas entre si. Os pobres são os “pobres de espírito”, ou seja, os “mansos”, “os que choram” e “os que têm fome e sede de justiça”. Hoje se pode olhar para os indígenas Yanomami, e ver neles a situação dos pobres no tempo de Jesus. Eles são pobres de espírito, pois não visam o acúmulo de bens, são “mansos”, “choram”, tem “fome e sede de justiça”. Oxalá o país seja sensível para uma outra lógica e assim se possa caminhar na contramão daquilo que se implantou em nosso Brasil.
O segundo grupo de “bem-aventuranças” (vv. 7-11) busca orientar o comportamento cristão. Enquanto as quatro primeiras mostram a “situação” de um grupo de pessoas, no segundo, colocam-se as “atitudes” necessárias aos discípulos, que transformam as “situações” em “ocasião” de vida nova. A miséria de uns pode gerar atitudes de “misericórdia”, nascidas de um coração capaz de compadecer-se, de amar sem limites, de deixar-se tocar pelos sofrimentos e alegrias dos outros. A “pureza de coração” é uma atitude de um coração honesto e leal, que não pactua com a duplicidade e o engano. A atitude de “construir a paz” recusa aceitar que a violência e a lei do mais forte conduzam as relações humanas. Felizes os “perseguidos por causa da justiça” que, por causa de seu agir em favor do Reino, são perseguidos, humilhados, caluniados, agredidos.
A última “bem-aventurança” (v. 11) é, na prática, uma aplicação concreta da oitava e o evangelista convida a resistir ao sofrimento e à perseguição.
No seu conjunto, as “bem-aventuranças” deixam uma mensagem de esperança e de alento para os pobres, os fracos, os perseguidos. Anunciam que Deus os ama e que está do lado deles; confirmam que a libertação está chegando e que a sua situação vai mudar.
Imaginemos este Evangelho sendo lido aos índios Yanomamis!!! Não esqueçamos também de que este discurso foi dirigido aos discípulos de Jesus: “E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte, e, assentando-se, aproximaram-se dele os seus discípulos (Mt 5,1). Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ