Domingo de Ramos
Aclamação, traição, glorificação – Mc 14,1–15,47 – Domingo de Ramos! A liturgia deste último Domingo da Quaresma convida-nos a contemplar o grandioso mistério de nossa salvação. Com o relato da aclamação de Jesus como Messias e sua entrada simbólica solene em Jerusalém, a liturgia nos convida a também aclamarmos Jesus como nosso Rei. Ramos que manifestam a alegria da acolhida de Jesus são ramos abençoados. As leituras que a Liturgia de hoje nos propõe são luz para o relato da Paixão. Na primeira leitura temos a figura do “servo de Deus”, fiel ao projeto do Pai. O hino cristológico da segunda leitura é a síntese poética do grande mistério de nossa salvação: aniquilou-se e foi exaltado. O Evangelho relata-nos a Paixão e Morte de Jesus, segundo o evangelista Marcos. O relato, certamente fundamentado em acontecimentos concretos, não é uma reportagem jornalística da condenação à morte de um inocente, mas é uma catequese destinada a apresentar Jesus como o Filho de Deus, que foi crucificado por amor. Desde o início do Evangelho (cf. Mc 1,1), Marcos se propôs a apresentar Jesus como o “Filho de Deus”. Junto da cruz o centurião romano, quando vê como Jesus cumpriu o plano do Pai até à última gota de sangue, exclama: “na verdade, este homem era Filho de Deus” (Mc 15,39). O relato da paixão e morte de Jesus é uma narrativa de muita violência, injustiça, crueldade, pa contra um homem que “fez bem todas as coisas”. Foi chamado pelo Pai para uma missão de anunciar um mundo novo, de justiça, de paz e de amor para toda a humanidade. Sua proposta entrou em choque com o projeto de opressão que domina o mundo, de ontem e de hoje. Olhemos mais de perto o relato da Paixão na versão de Marcos, versão semelhante a de Mateus e Lucas, mas com alguns destaques dignos de nota. a) Ao longo de todo o processo, Jesus manifesta uma grande serenidade, dignidade e entrega. Não é passivo, mas aceita o caminho da cruz. Diferente de Mateus e Lucas, não interpela Judas na traição, fica em silêncio. Em Marcos Jesus também não reclama de Pedro por cortar a orelha do servo do sacerdote. Diante do tribunal, também fica em silêncio. Uma dignidade de Filho de Deus. b) Marcos insiste que Jesus é o Filho de Deus e isto é muito sublinhado ao longo da narrativa da paixão. No horto das Oliveiras, Jesus reza e chama Deus de “Abba”, “papai”. Nas orações hebraicas não se chamava a Deus de Pai. Seria uma irreverência tratar a Deus com tanta familiaridade. No interrogatório, quando o sumo sacerdote lhe pergunta se Ele era o “Messias”, afirma com toda a dignidade: “Eu Sou”, título divino do AT. Por Jesus se declarar Filho de Deus, o sumo sacerdote rasga suas vestes. Jesus está blasfemando…c) Mesmo com tanta insistência de que Jesus é o Filho de Deus, Marcos mostra a fragilidade humana de Jesus. No Jardim das Oliveiras Marcos afirma que Jesus sentiu “pavor” e “angústia”. Mateus diz que Jesus sentiu “tristeza” e Lucas nada diz sobre estes sentimentos. Na morte Jesus grita: “meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? Jesus é homem e experimenta a dor como qualquer ser humano. d) Marcos sublinha que Jesus enfrenta sozinho o seu destino de morte. Vive a mais profunda solidão. Não há anjo que o console; os discípulos o abandonam, só Pedro é citado e ainda por negar; não aparece a mulher de Pilatos pedindo para preservar Jesus; não há mulheres que choram por Jesus, como aparece em Lucas. e) Somente Marcos fala de um Jovem que foge nu quando agarrado pelos soldados. Concluindo, podemos perceber que a narrativa da Paixão segundo Marcos, é uma narrativa muito sóbria, mas escrita em linguagem muito dura e concreta. As ações contra Jesus são descritas com verbos de violência: esbofetear, cuspir, açoitar, rasgar as vestes, etc. Jesus mantém-se nobremente em silêncio, enquanto seus executores aparecem sempre mais cruéis. Uma morte assim, somente o Filho de Deus é capaz de assumir. Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ