2º Domingo do Tempo Comum
“Não tem vinho”- Jo 2,1-11 – Neste domingo, após a festa do Batismo de Jesus e encerramento do tempo de Natal, a liturgia passa para o 2º domingo do Tempo Comum, tempo que nos mergulha na vida e missão de Jesus, suas palavras e suas obras. É a chamada “vida pública”, na qual Ele anuncia e realiza o Reino de Deus. Estamos no Ano C da Liturgia e o evangelho é de Lucas, mas neste domingo temos o belo relato de João que utiliza a metáfora do “bodas”, no cenário de uma festa de casamento em Caná da Galileia. Um relato artisticamente construído, onde cada personagem, cada cenário, cada objeto ou ação é portador de grande simbolismo. Mergulhemos mais atentamente no Evangelho. João inicia seu evangelho revelando o mistério da pessoa de Jesus (cf Jo 1). Em seguida convida-nos a ver o início da missão (cf Jo 2,1ss). Leva-nos até Caná da Galileia, uma pequena aldeia, situada a alguns quilómetros de Nazaré. João diz-nos que foi em Caná que Jesus “deu início aos seus sinais”. “Sinal”, no evangelho de João, indica que certas ações realizadas por Jesus significam outras realidades que vão além do gesto realizado. Assim, o gesto realizado por Jesus em Caná da Galileia João foi o “início” dos seus “sinais”. Significa que virão outros. Mas este, sendo o primeiro, certamente é chave de leitura para os demais. Neste primeiro sinal está o programa de Jesus. O relato que João nos oferece não é um relato de um fato ocorrido. A mensagem teológica “por trás das palavras” vai muito além do relato em si. Caso fosse um relato concreto, muitas lacunas ficam sem reposta. Quem eram aqueles noivos? Parece que não interessa tal informação. Por que faltou vinho, visto que o relato gira em torno do vinho? A falta de vinho parece mais importante do que qualquer outra coisa. Por que é que se diz que a mãe de Jesus “estava lá” e o que ela teria a ver com a falta de vinho? Como é possível imaginar que numa casa do povo tivesse seis talhas de pedra destinadas à purificação? O cenário não era nem templo, nem sinagoga. Por que Jesus foi convidado para este casamento? Os noivos como que desaparecem no relato, uma vez que o chefe de mesa e os serventes tem mais atuação. O fato de o primeiro sinal de Jesus ser a transformação da água em vinho, algo tão simples do cotidiano, gera perplexidade. O primeiro sinal poderia ser algo mais vistoso. E no meio disto tudo, Jesus diz que sua “hora” ainda não chegou. Os estudiosos concluíram que este cenário de “casamento” evoca uma outra realidade: é uma metáfora da “aliança” de amor entre Deus e o seu Povo. É sob esta luz que temos de ler este texto. O relato inicia com apenas dizendo que “houve uma casamento” e que a “mãe de Jesus estava lá”. Parece estar lá por direito, por pertencer ao grupo. A seguir, afirma que “Jesus e os discípulos estavam convidados”. Estaria a mãe representando o povo de Israel fiel, aquele povo “peregrino da esperança” pela vinda do Messias? Jesus e os discípulos são “convidados”, não pertencem àquela comunidade. A mãe de Jesus, figura do Israel fiel que espera o messias, se dirige a Jesus: “eles não têm vinho”. O vinho, na cultura israelita, é carregado de forte simbolismo: sinal de alegria e de festa, símbolo do amor que une o esposo e a esposa. Falta vinho na relação entre Deus e seu povo. O povo estava abandonado como as “seis talhas de pedra” que estão vazias, já não servem mais. O número seis é igualmente simbólico, pois se trata da “imperfeição”. As pedras da Aliança do Sinai foram esvaziadas. Jesus manda encher as talhas de água. Cada uma delas levava entre oitenta e cento e vinte litros. Seis talhas cheias de vinho. Um exagero! Antes Jesus dissera que sua “hora” não havia chegado e agora Ele sinaliza para a grandeza da graça divina da “nova aliança”. O vinho novo e muito bom da nova aliança. Uma Igreja Sinal quer ser este vinho novo cujas talhas ficaram esvaziadas ao longo da História. Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ