1º Domingo da Quaresma
“Jesus teve fome”- Mt 4,1-11 – Neste 1º Domingo da Quaresma, somos convidados a mergulhar na profundidade do mistério de Jesus e na grandeza da missão da Igreja. O foco da missão da Igreja é a Campanha da Fraternidade (CF), com seu tema: FRATERNIDADE E FOME, e o Lema: “Dai-lhes vós mesmos de comer’ (Mt 14,16). Uma Campanha que vem provocando as mais diversas reações: uns cristãos acusam a Igreja de estar abandonando o sentido da Quaresma, um tempo especial de conversão, penitência, piedade, esmola, oração e jejum, substituídos por estas Campanhas que visam uma prática mais social. A Igreja, representada pela CNBB, busca abrir os horizontes das práticas quaresmais por meio de ações evangélicas concretas, presentes nas CF. Fatalmente, o anúncio da Boa Nova de Jesus gera conflitos. Conflitos que Jesus viveu logo no inicio de sua missão, como nos relata o Evangelho de Mateus, as conhecidas “tentações de Jesus”.
O relato das tentações como que prepara a vida pública de Jesus. Vem logo após o Seu batismo, quando o Pai declara ser este “o seu filho amado”. O cenário do episódio é o deserto. O Evangelho diz que “Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto, a fim de ser tentado pelo demônio”. Uma afirmação provocante. O Espírito conduz Jesus para o deserto para ser tentado pelo demônio? Que espírito é este? A primeira grande proclamação é que Jesus se deixa conduzir pelo Espírito, até quando tentado.
O deserto, no imaginário judaico, além de ser o espaço do encontro com Deus, é o lugar da “prova”, onde os israelitas experimentaram, por diversas vezes, a tentação de abandonar Jahwéh e seu projeto de libertação. Será que a história vai se repetir e Jesus vai ceder à tentação de dizer “não” ao projecto de Deus? Quando o povo no deserto sofreu a fome, murmurou contra Deus e contra Moisés. Jesus teve fome no deserto e se deixou conduzir pela Palavra de Deus, como bem lemos na narrativa.
O relato das tentações não é uma reportagem histórica elaborada por um jornalista que presenciou um combate teológico entre Jesus e o diabo, em algum lugar no deserto… É, sim, uma página de catequese, cujo objetivo é ensinar-nos que Jesus, apesar de ter sofrido tentações, soube pôr o projeto do Pai acima de tudo. As três tentações não são mais do que três faces de uma única tentação: a de não confiar em Deus e a negar o seu projeto. “Se és Filho de Deus”! Colocar sob suspeita a declaração do Pai de que Jesus é o “Filho amado”, é gerar de um caminho de egoísmo, de orgulho e de auto-suficiência, fora do projeto de Deus. O diabo não conseguiu tirar Jesus do Caminho.
O modo como o redator descreve as tentações é extremamente didático. São como que três “parábolas”. A primeira (vv. 3-4) sugere que Jesus poderia ter resolvido situação de “fome” de forma apenas material, de fazer dos bens materiais a prioridade fundamental da vida e isto de forma até arrogante. Jesus sabe que “nem só de pão vive o homem” e que a felicidade humana não está na acumulação egoísta dos bens. A segunda “parábola” (vv. 5-7) sugere que Jesus poderia ter escolhido um caminho de sucesso fácil, mostrando o seu poder através de gestos espetaculares, sendo admirado e aclamado pelas multidões. Jesus afirma que não está interessado em utilizar os dons de Deus para satisfazer projetos pessoais de êxito e de triunfo humano. A terceira “parábola” (vv. 8-10) propõe a Jesus escolher um caminho de poder, de domínio, de prepotência, ao jeito dos grandes da terra. É uma tentação diabólica em todos os tempos. Só o Pai é absoluto e só Ele deve ser adorado.
A conclusão é clara: ser “Filho de Deus” significa viver em comunhão com o Pai, escutar a sua voz, realizar os seus projetos, cumprir obedientemente os seus planos. De Jesus vai nascer um novo Povo de Deus, cuja vocação essencial é viver em comunhão com o Pai e concretizar o seu projecto para o mundo.
As reflexões da CF oferecem pistas para vencermos as tentações de uma vida de “santidade apenas individual”, de “esmola, oração e jejum” como atos de piedade intimista, tantas vezes fora do projeto de Deus, onde prevalece a satisfação pessoal e não se assume a verdadeira “filiação divina” e suas consequências. Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ