16º Domingo do Tempo Comum – 17/07/2022

14/07/2022

“Sentada aos pés de Jesus”Lc 10,38-42 – No décimo sexto domingo do Tempo Comum a Liturgia nos convida a focar diversos aspectos da vida em Deus. A primeira leitura nos coloca em contato com nosso pai Abraão e a narrativa nos oferece várias portas de entrada para saborear a Palavra de Deus. A acolhida de dois visitantes mostra a beleza da hospitalidade na vida humana. A fé e a confiança de Abraão geram vida nova. Esta hospitalidade tem beleza especial no relato do Evangelho deste domingo.

Situando a narrativa, continuamos a percorrer o “caminho para Jerusalém”, durante o qual Jesus vai revelando aos seus discípulos o Projeto do Pai e vai preparando-os para o testemunho do Reino. O episódio narrado por Lucas situa-nos numa aldeia não identificada, em casa de Marta a Maria. Estas duas irmãs são, provavelmente, as mesmas a que João se refere (cf Jo 11,1-40 e Jo 12,1-3). Se assim for, o cenário é Betânia, uma pequena aldeia situada cerca de 3 km de Jerusalém.

É possível que estejamos num contexto de refeição, porém o texto nada informa. Não se diz também se esta refeição seria um banquete e se havia mais pessoas convidadas. Nada também se informa sobre os discípulos. Não se sabe se Marta preparava comida, mas apenas que “atarefava-se com muito serviço”. Que “serviço” é este? No Evangelho de João (cf 12,1-3) lemos que “ofereceram um banquete para Jesus” e Marta “servia”. Em João era um banquete com Lázaro redivivo e Marta era a “diaconisa”, a que zelava pelo bem servir aos comensais.

O Evangelho deste dia se concentra em Marta, Maria e Jesus. Diante de lacunas informativas e de diversos “silêncios”, pode-se suspeitar que não se trata de um relato histórico, biográfico e também não se trata de um banquete. O foco é outro. O simbolismo e a teologia predominam em todo o cenário. O que significa a queixa de Marta para Jesus, de que estava “atarefada com muito serviço” e que Maria não ajudava no “serviço”?

No episódio Jesus toma a defesa de Maria que estava “sentada aos pés de Jesus, ouvia a sua Palavra”. Há um pormenor que é preciso destacar. Certamente é uma chave de Leitura para todo o relato. Trata-se da posição de Maria: “sentada aos pés de Jesus”. É a posição típica de um discípulo diante do seu mestre (cf. Lc 8,35; At 22,3). Temos uma situação surpreendente para o contexto da época, em que as mulheres eram consideradas inferiores, com seus direitos religiosos e sociais muito limitados. Nenhum “rabbi” aceitava uma mulher no grupo dos discípulos. Nenhum doutor da época ensinava a Lei as mulheres. Jesus, o mestre dos mestres, reconhece o direito da mulher ser discípula: “Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada”. Maria, numa sociedade patriarcal, é livre para fazer sua escolha, rompendo com os papéis tradicionais.

A postura de Jesus em relação às mulheres é extremamente revolucionária. Nos anos 80 d.C, quando Lucas escreveu o Evangelho, já havia uma tendência nas comunidades primitivas de manter a mulher no seu papel tradicional, voltada aos serviços domésticos. O evangelista defende o novo trazido por Jesus. Infelizmente este episódio foi lido à luz da oposição entre “ação” e “contemplação”. Não é isso que aqui está em causa. Jesus mostra que o essencial é ouvir a Palavra e que a mulher tem o direito de ser discípula. Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ