23º Domingo do Tempo Comum

05/09/2024

 “Abre-te” –  Mc 7,31-37 – A liturgia do 23.º Domingo do Tempo Comum mostra Jesus agindo em favor da vida, cuidando do dom da comunicação e da comunhão entre as pessoas. Na primeira leitura, tirada do livro do profeta Isaías, há palavras de ânimo aos que estão desanimados, desiludidos e sem esperança. Por meio de linguagem simbólica, afirma que Deus vai fazer os cegos verem novamente, os surdos voltarão a ouvir, os coxos vão pular e os mudos vão cantar. É a promessa de resgate da vida do povo. Isto vai se realizar concretamente em Jesus, conforme nos narra o Evangelho deste dia. Buscando uma aproximação maior do texto, vemos que o relato está situado no final de Marcos sete.  Trata-se da conclusão de narrativas polêmicas, como vimos no domingo anterior. Na estrutura literária de Marcos, os relatos se referem à fase final de Jesus na Galileia, quando as polêmicas com seus opositores chegam quase ao limite do suportável. As discussões com os fariseus e com doutores da Lei, a propósito de questões legais e da “tradição dos antigos”, levam  Jesus abandonar o território judeu e passar, por algum tempo, em território pagão. Inicialmente parece que Jesus queira isolar-se, não quer que ninguém saiba onde está, mas logo chega a mulher pagã, siro-fenícia. Depois busca peregrinar pela Decápole, cidades de cultura grega. Neste cenário geográfico trazem a Jesus uma pessoa com dificuldade de comunicação, limitado em suas relações, alguém com problemas no convívio social, enfim, um marginalizado. Do ponto de vista religioso, o surdo-mudo é um “impuro”, um pecador, um maldito. Pela sua surdez, é incapaz de escutar a Lei. Logo, está fora da possibilidade de salvação, segundo a teologia oficial. Para agravar mais ainda a situação, o surdo-mudo vive no território pagão. Está duplamente excluído da salvação de Deus. Os que trazem o paciente a Jesus suplicam que Jesus lhe imponha as mãos. O gesto de impor as mãos significa transmissão de poder.  Os gestos que Jesus realiza são um tanto estranhos e, certamente, tem força simbólica: “Jesus, afastando-Se com ele da multidão, meteu-lhe os dedos nos ouvidos e com saliva tocou-lhe a língua. Depois, erguendo os olhos ao Céu,  suspirou e disse-lhe: «Effathá», que quer dizer “Abre-te”. No ensinamento que Marcos nos traz, este surdo-mudo é uma personalidade que pode indicar diversas pessoas ou situações: pode ser símbolo de todos aqueles que vivem fechados no seu mundo, de ouvidos fechados às propostas de Deus, no caso até os fariseus e doutores da lei. Pode ser também símbolo de todos aqueles que a teologia oficial considerava pecadores e malditos, incapazes de estabelecer uma relação verdadeira com Deus, de escutar a Palavra de Deus e de viver de forma coerente com os desafios de Deus. O surdo-mudo pode ainda ser símbolo dos discípulos que não conseguem ouvir corretamente a mensagem de Jesus e a proposta do reino. Jesus convida a todos a abrir-se  para bem ouvir e assim falar corretamente. A abertura ao novo, ao outro, a Deus leva ao grande milagre: Imediatamente se abriram os ouvidos do homem, soltou-se-lhe a prisão da língua e começou a falar corretamente. Mas para ser anunciador da Boa Nova de Jesus, o discípulo precisa ainda guardar silêncio. É o “segredo messiânico”, tão presente em Marcos. Depois da revelação do verdadeiro Messias, que se dará na cruz, serão enviados a todas as nações. Por hora importa atender a ordem de Jesus: “abre-te”. (Ir. Zenilda L. Petry)